Download Angina Instável Desencadeada por Tumor Cardíaco Primário

Survey
yes no Was this document useful for you?
   Thank you for your participation!

* Your assessment is very important for improving the workof artificial intelligence, which forms the content of this project

Document related concepts
no text concepts found
Transcript
Rev Bras Cardiol Invas 2005; 13(4): 311-314.
Bayerl DM, et al. Angina Instável Desencadeada por Tumor Cardíaco Primário: Relato de Caso. Rev Bras Cardiol Invas 2005; 13(4):
311-314.
Relato de Caso
Angina Instável Desencadeada por Tumor Cardíaco
Primário: Relato de Caso
Denis Moulin Bayerl1, Walkimar Ururay Veloso1, Jorge Willian Gadioli1, Renato Serpa1,
Roberto Almeida1, Pedro Abílio Reseck1, Sérgio Almeida de Oliveira2
RESUMO
SUMMARY
Paciente do sexo feminino, 38 anos, com quadro clínico de
angina instável progressiva e exames complementares positivos
para isquemia. À coronariografia observamos tronco de
artéria coronária esquerda conectado à massa tumoral,
causando compressão importante do mesmo, sendo a irrigação
das artérias descendente anterior e circunflexa realizada
por meio de rica circulação colateral, originada da artéria
coronária direita. Encaminhada paciente para cirurgia cardíaca, sendo realizada exérese do tumor e revascularização
miocárdica.
Unstable Angina Triggered by Primary Cardiac Tumor:
Case Report
Female patient, 38 years old, with a progressive unstable
angina condition, and positive complementary exams for
ischemia. Coronariography showed left coronary artery
trunk connected to tumoral mass, resulting in relevant compression, with anterior descending and circumflex arteries irrigation
through rich collateral circulation from right coronary artery.
The patient was submitted to heart surgery. The tumor was
excised and myocardial revascularization was carried out.
DESCRITORES: Neoplasias cardíacas. Paraganglioma. Angina instável.
DESCRIPTORS: Heart neoplasms. Paraganglioma. Unstable
angina.
O
grande maioria (75%) são tumores benignos, sendo os
mixomas os mais freqüentes2. Apenas 25% dos tumores
cardíacos primários são malignos3.
principal mecanismo fisiopatológico das síndromes coronarianas agudas, como a angina instável, é a ruptura ou fissura da placa aterosclerótica,
resultando usualmente na superposição de plaquetas
e conseqüente formação de trombos.
A angina instável de causa secundária (tipo A da
classificação de Braunwald)1 é uma apresentação clínica
menos freqüente, que ocorre geralmente na presença
de uma condição extracardíaca que intensifica a isquemia
miocárdica.
A doença arterial coronariana (DAC) tem uma alta
prevalência e incidência mundial, apresentando variadas etiologias e uma diversidade muito grande de
apresentação clínica.
Os tumores cardíacos primários constituem uma
afecção rara, cuja incidência varia de 0,08% a 0,3%
de todos os tumores em dados de autópsia. Na sua
1
Vitória Apart Hospital, Serra, ES.
Instituto do Coração de São Paulo, São Paulo, SP.
Correspondência: Denis Moulin Bayerl. R. Amélia Tartuce Nasser 1110,
Apto. 504. Bairro Jardim Penha. Vitória, ES - Tel: (27) 3348-5991
hosp VAH. • e-mail: [email protected]
Recebido em: 12/12/2005 • Aceito em: 10/01/2006
2
Já os tumores cardíacos secundários ou metastáticos
(câncer broncogênico, melanomas) são de 20 a 40
vezes mais freqüentes que os primários em pacientes
adultos4-6.
RELATO DE CASO
Paciente do sexo feminino, 38 anos, previamente
hígida e sem fatores de risco de maior relevância para
DAC. Iniciou, há aproximadamente um ano, quadro
de precordialgia típica, inicialmente aos grandes esforços
físicos, apresentando piora progressiva nos últimos
três meses, com aumento da intensidade e freqüência
dos episódios, mesmo em uso da medicação antianginosa. Referia, ainda, quadro associado de cefaléia e
alguns episódios de sudorese. Exame físico sem maiores anormalidades, porém encontrava-se com quadro
de hipertensão leve. Eletrocardiograma de repouso com
distúrbio de repolarização anterior. Encaminhada ao
teste ergométrico, sendo francamente positivo, com
infradesnivelamento do segmento ST de 4 mm associado
à sintomatologia típica. Ecocardiograma transtorácico
sem alteração segmentar de contratilidade. Solicitada
311
Denis.p65
311
11/7/2006, 19:00
Bayerl DM, et al. Angina Instável Desencadeada por Tumor Cardíaco Primário: Relato de Caso. Rev Bras Cardiol Invas 2005; 13(4):
311-314.
cintilografia miocárdica para melhor avaliação da isquemia. Cintilografia mostrou isquemia em território ínferolateral do VE.
e parede anterior do VE (Figuras 4 e 5). Após diagnóstico, decidiu-se encaminhar a paciente para avaliação
do tratamento cirúrgico.
Diante dos resultados, a paciente foi encaminhada
para cinecoronariografia que evidenciou: tronco de
artéria coronária esquerda (TCE) conectado à provável
massa tumoral vascular, formada por imagens angiográficas sugestivas de fístulas e aneurismas, causando
compressão e diminuição da luz do TCE em 70%
(Figuras 1 e 2). Não se observava opacificação dos
segmentos distais das artérias descendente anterior (DA)
e circunflexa (CX). Artéria coronária direita dominante,
calibrosa, opacificando através de excelente rede de
circulação colateral as artérias DA e CX, que se encontravam relacionadas com a massa tumoral (Figura 3).
Ventriculografia esquerda evidenciando hipocontratilidade leve de parede ântero-apical. Aortografia normal.
Para melhor avaliação do provável tumor, optouse pela realização de ressonância magnética cardíaca.
O exame mostrou massa de natureza vascular de 7,2
x 5,1 cm envolvendo o TCE, com extensão até o terço
médio da parede anterior do VE e até o arco aórtico,
sem planos de clivagem com aorta, parede pulmonar
Figura 3 - Cinecoronariografia direita em projeção OAE, evidenciando
circulação colateral para artéria coronária esquerda.
Figura 4 - Ressonância magnética cardíaca demonstrando massa tumoral.
Figura 1 - Cinecoronariografia esquerda em projeção OAD, demonstrando TCE conectado à massa tumoral.
Figura 2 - Projeção OAE caudal ( Spider view ).
Figura 5 - Ressonância evidenciando a íntima relação do tumor com
o TCE.
312
Denis.p65
312
11/7/2006, 19:00
Bayerl DM, et al. Angina Instável Desencadeada por Tumor Cardíaco Primário: Relato de Caso. Rev Bras Cardiol Invas 2005; 13(4):
311-314.
Neste período, houve piora dos sintomas, mesmo
estando em uso da medicação (beta-bloqueador e nitrato), sendo a paciente internada algumas vezes na
Unidade Coronariana com quadro de angina instável.
Paciente foi, então, submetida à cirurgia cardíaca
em São Paulo, para retirada do tumor e revascularização
miocárdica da primeira diagonal com sucesso. O tumor
foi encaminhado para exame anatomopatológico, tendo
diagnóstico de paraganglioma.
No pós-operatório, evoluiu sem intercorrências,
sendo submetida antes da alta a estadiamento de varredura tumoral por meio de Pet-Scan, sem sinais de
malignidade. Houve sinal de captação em vértebra T8,
porém não confirmado pela cintilografia com MIBG.
Realizado, ainda, cateterismo pós-operatório, evidenciando TCE ocluído e ponte de safena pérvia para o
ramo diagonal, opacificando todo sistema coronariano
esquerdo.
Atualmente, encontra-se assintomática e realizando
atividades profissionais, estando em acompanhamento
cardiológico e oncológico ambulatorial.
DISCUSSÃO
O caso relatado é extremamente raro e não menos
complexo, pois se trata de um caso típico de insuficiência coronariana, em uma paciente mãe jovem de 38
anos, ativa, sem fator de risco maior para DAC, com
uma etiologia incomum: um tumor cardíaco primário.
No caso descrito, os paragangliomas são neoplasias
benignas, apresentando malignização em apenas 6,4%
dos casos. Surgem a partir do tecido paragangliônico
do sistema nervoso autônomo (SNA). Os paragânglios
estão amplamente distribuídos no corpo humano, tendo
sido encontrados nos pulmões, coração, trato gastrointestinal, retroperitônio, bexiga e, mais raramente, na
cabeça e pescoço. No coração, localizam-se, na sua
maioria, na superfície epicárdica de sua base, no teto
da aurícula esquerda e, com menos freqüência, no
septo interatrial7.
Apresentam maior incidência nas idades entre 18
a 85 anos, sem prevalência de sexo8.
Na sua grande maioria são produtores de catecolaminas, sendo os pacientes muitas vezes hipertensos,
apresentando cefaléia freqüente e flush. Os paragangliomas provêm do sistema extra-adrenal, enquanto os
feocromocitomas derivam do sistema adrenal. Têm crescimento lento e em 10% podem infiltrar-se localmente9.
A sua localização, diagnóstico e tratamento geram discussão, controvérsia e interesse, principalmente pelos
cuidados peculiares que devem ser tomados na sua
investigação e no seu tratamento em decorrência da
sua hipervascularização e localização.
De um modo geral, por se tratar de afecção rara,
os tumores cardíacos apresentam um diagnóstico ini-
cial complexo, principalmente devido à diversidade
de suas manifestações clínicas, muitas vezes, mimetizando cardiopatias comuns, como insuficiência coronária, insuficiência cardíaca e tamponamento, o que
dificulta muito o diagnóstico diferencial de cardiopatia
tumoral 10-12.
O método de escolha para a avaliação diagnóstica
e para o controle evolutivo das massas cardíacas é o
ecocardiograma13,14. Atualmente, a ressonância nuclear
magnética tem fornecido informações adicionais importantes sobre a relação do tumor com estruturas intracardíacas normais e/ou extensão para vasos adjacentes
e estruturas mediastinais15.
A angiografia e o cateterismo cardíaco não são
exames necessários em todos os casos de tumores
cardíacos. A dificuldade de definição por meio dos
exames não invasivos, a provável presença de tumor
cardíaco maligno e a suspeita de lesões cardíacas
associadas, são algumas situações nas quais sua indicação se impõe16. Os principais achados angiocardiográficos são: 1) compressão ou deslocamento das câmaras cardíacas ou grandes vasos; 2) deformidades
das câmaras cardíacas (geralmente nos malignos); 3)
defeito de enchimento intracavitário; 4) variações da
espessura do miocárdio; 5) derrame pericárdico; 6)
alterações de contratilidade. Além disto, a coronariografia
pode, em alguns casos, permitir a identificação do
suprimento vascular do tumor, sua relação com as
artérias coronárias e se há presença de DAC associada17.
A principal complicação do cateterismo é a embolização
periférica, devido ao deslocamento de um fragmento
do tumor ou trombo associado.
O tratamento dependerá do tipo de tumor, ou
seja, se é primário ou metastático. No caso de primário
benigno, a retirada cirúrgica é o tratamento de escolha
e, em muitos casos, resulta em cura completa.
Apesar da maioria dos tumores ser histologicamente
benigna, todos os tumores cardíacos são potencialmente
letais, pois podem causar obstruções intracavitárias,
valvulares e/ou vasculares, embolização periférica, além
de distúrbios de ritmo e/ou condução.
Já nos metastáticos, o tratamento é paliativo, consistindo em medidas gerais e medicação sintomática.
Apesar das tentativas de diversas combinações de cirurgia, radioterapia e/ou quimioterapia, o prognóstico é
reservado 16,18,19.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. Braunwald E. Unstable angina: a classification. Circulation
1989;80:410-4.
2. Bogren HG, De Maria AN, Mason DT. Imaging procedures
in the detection of cardiac tumors, with emphasis on echocardiography: a review. Cardiovasc Intervent Radiol 1980;
3:107-25.
3. Macruz R, Snitcowsky R. Cardiologia pediátrica. São Paulo:
Savier;1984. p.523-32.
313
Denis.p65
313
11/7/2006, 19:00
Bayerl DM, et al. Angina Instável Desencadeada por Tumor Cardíaco Primário: Relato de Caso. Rev Bras Cardiol Invas 2005; 13(4):
311-314.
4. Lam KY, Dickens P, Chan AC. Tumors of the heart: a 20year experience with a review of 12485 consecutive autopsies. Arch Pathol Lab Med 1993;117:1027-31.
5. Reynen K. Frequency of primary tumors of the heart. Am J
Cardiol 1996;77:107.
6. Burke A, Virmani R. Tumors of the heart and great vessels.
Atlas of tumor pathology. Washington:Armed Forces Institute of Pathology;1996. p.231.
7. Cubides CA, Salazar G, Munoz A, Pedraza J, Hernández E,
Martínez J et al. Tumores cardiacos primarios. Rev Colomb
Cardiol 2003;10:472-85.
8. Jebara VA, Uva MS, Farge A, Acar C, Azizi M, Plouin PF
et al. Cardiac pheochromocytomas. Ann Thorac Surg 1992;
53:356-61.
9. Mc Allister HÁ, Fenglio JJ. Tumors of the cardiovascular
septum. Atlas of tumor pathology. Washington: Armed Forces
Institute of Pathology;1978. p.5-71.
10. Goodwin JF. The spectrum of cardiac tumors. Am J Cardiol
1968;21:307-14.
11. Harvey WP. Clinical aspects of cardiac tumors. Am J Cardiol
1968;21:328-43.
12. Salcedo EE, Cohen GI, White RD, Davison MB. Cardiac
13.
14.
15.
16.
17.
18.
19.
tumors: diagnosis and management. Curr Probl Cardiol
1992;17:73-137.
Obeid AI, Marvasti M, Parker F, Rosenberg J. Comparison of
transthoracic and transesophageal echocardiography in diagnosis of left atrial myxoma. Am J Cardiol 1989;63:1006-8.
Mugge A, Daniel WG, Haverich A, Lichtlen PR. Diagnosis
of noninfective cardiac mass lesions by two-dimensional
echocardiography: comparison of the transthoracic and transesophageal approaches. Circulation 1991;83:70-8.
Pizzarello RA, Goldberg SM, Goldman MA, Gottesman R, Fetten JV, Brown N et al. Tumor of the heart diagnosed by magnetic resonance imaging. J Am Coll Cardiol 1985;5: 989-91.
Braunwald E. Tratado de medicina cardiovascular. São Paulo:
Roca;1991.p.1538-49.
Singh RN, Buskholder JA, Magovern GJ. Coronary arteriography
as an aid in left atrial myxoma diagnosis. Cardiovasc Intervent
Radiol 1984;7:40-3.
Topol EJ. Textbook of cardiovascular medicine. New York:
Lippincot-Raven;1998. p.971.
Becker RC, Loeffler JS, Leopold KA, Underwood DA. Primary tumors of the heart. A review with emphasis on diagnosis
and potential treatment modalities. Semin Surg Oncol 1985;
1:161-70.
314
Denis.p65
314
11/7/2006, 19:00